Defensor do garimpo em terras indígenas e presidente de associação ligada ao lobby do setor em Brasília, o candidato comercializa minério da Ourominas DTVM, denunciada como uma das maiores compradoras de ouro extraído ilegalmente na Amazônia.
Roberto Soares da Silva, candidato a deputado federal pelo Amapá com o nome de urna de Beto Silva Ourominas (PSC), carrega na alcunha a marca da segunda maior comercializadora de ouro do país. Ourominas, a empresa familiar que nasceu nos garimpos do Mato Grosso na década de 1980, e atualmente é comandada pelo seu irmão Juarez de Oliveira e Silva Filho, mantém uma teia de vinculações empresariais e pessoais em todos os elos da cadeia do ouro, incluindo uma holding em Dubai e clientes de luxo.
A Ourominas Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM) também é apontada pelo Ministério Público Federal (MPF) como uma das maiores compradoras de ouro extraído de garimpos ilegais na Amazônia. A empresa já foi alvo de pelo menos três operações que investigaram a compra e a venda do minério, Operações Warari Koxi (ação penal de 2018), Dilema de Midas (2019) e Minamata (2019), além de também ter sido investigada pelo comércio ilegal de mercúrio (2013).
Beto Ourominas não está entre os denunciados nessas operações, e a empresa nega que ele tenha atuação na DTVM. Apesar de ser um dos fundadores da Ourominas com seus irmãos, Beto não figura entre os sócios. Suas relações oficiais com a Ourominas DTVM ocorriam de forma lateral, através das empresas de metalurgia Papibaquigrafo e a Ourominas Análise de Metais, as duas já desativadas. Seu irmão, Juarez de Oliveira, é investigado com a Ourominas por crimes contra o meio ambiente, lavagem de dinheiro e contrabando.
Atualmente, Beto é sócio na Ourominas Individual, que, apesar de levar o nome da empresa familiar, tem CNPJ próprio e não aparece nas investigações do MPF. Segundo a Ourominas DTVM, esta empresa individual não tem nenhuma relação com suas operações no mercado.
Mas na internet, Beto criou um site para comercializar ouro justamente da Ourominas DTVM. O portal chamado OMind, que trás na homepage os dados de contato de Beto Ourominas, oferece os mesmos serviços da DTVM: as barras de ouro e cartões, que carregam lâminas de ouro de até 25 gramas, anunciados são produzidos e vendidos pela empresa do irmão de Beto. Tanto os cartões como as barras trazem a logomarca da DTVM investigada (uma estrela de David e as iniciais OM).
O site ainda informa: “Todas as informações trafegadas são criptografas, registradas pela OM DTVM Ltda (OMIND) e aferidas por auditoria externa.” O domínio foi registrado em nome do próprio Beto, em 2019, segundo informações do RegistroBR. Dados do portal de vendas da Omind apontam que já foram comercializados mais de mil cartões para mais de 500 clientes.
Além disso, Beto também negocia ouro pelo seu perfil pessoal no Instagram.
Ao InfoAmazonia o candidato disse que não tem nenhuma relação com a Ourominas DTVM. Perguntado sobre as investigações contra a empresa do irmão, disse que não tem nada a declarar. Ele não comentou sobre a origem do ouro que anuncia na internet.
Braço do lobby em Brasília
Em janeiro deste ano, Beto passou a registrar suas propostas e opiniões sobre garimpo e mineração em um canal no Youtube, chamado TV AMZ, em que mantém diálogos com políticos e figuras do setor – um dos seus convidados foi Zé Altino Machado: um dos responsáveis pelas três maiores invasões de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami nos anos 1970, 1980 e 1990. Na época, chegou a ser preso, que também se lançou candidato, ao Senado, mas desistiu nas últimas semanas.
Em tom de promessas de campanha, os programas do canal apresentam propostas e discutem ações para o setor, como o garimpo em terras indígenas e a concessão de mais benefícios para a classe garimpeira.
“Não é o índio o empecilho para esse tratado”, disse Beto para seu público, afirmando que os indígenas com quem conversou “demonstraram a vontade de ter uma vida empresarial”.
“Eu penso que o índio não se sente brasileiro, de tanta diferença com que é tratado o assunto indígena, e ele próprio indígena não participa da mesa de negociação. Ele também discutiu, em outro programa, a criação de um plano diretor para as áreas garimpeiras, para garantir infraestrutura básica e serviços como saúde e educação e como reduzir a “criminalização da atividade garimpeira”.
Beto é presidente da Associação Brasileira dos Metais Preciosos (Abramp), entidade que se reuniu com o ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia), ainda sob a presidência de Rogério Manoel, para tratar de assuntos do setor. A associação também participou de audiência na Câmara dos Deputados, na Comissão de Minas e Energia, para debater o licenciamento ambiental do garimpo na Amazônia.
A Abramp foi criada em novembro de 2017 com o alegado objetivo de congregar os “interesses comuns” dos diversos segmentos do mercado de metais preciosos em seus diferentes aspectos – passando pela fundição, negociação e distribuição, entre outros. A associação também oferece consultorias para regularização de garimpos.
Mas apesar da influência que demonstra ter, a campanha de Beto Ourominas é tímida na internet. As páginas que ele usa como candidato não são as mesmas informadas no TSE e têm poucas postagens. Na primeira prestação parcial de contas, o candidato apresentou R$ 3,4 mil em gastos com santinhos e adesivos.
Beto não se apresenta como garimpeiro, como outros candidatos, mas como “trabalhador da cadeia do ouro”, segundo disse em seu canal.
Dados da Agência Nacional de Mineração (ANM) mostram que Beto Ourominas mantém pelo menos sete requerimentos de lavra garimpeira ativos para explorar ouro e tantalita: mineral composto de nióbio e tântalo , no Amapá. Em nenhum dos pedidos foi concedido título para exploração.
MPF quer suspensão da Ourominas no mercado financeiro
Em 2021, o Ministério Público Federal (MPF) moveu ações judiciais pedindo a suspensão das atividades de três instituições financeiras acusadas de despejar no mercado nacional e internacional mais de 4,3 mil quilos de ouro ilegal nos anos de 2019 e 2020: Ourominas, FD’Gold e Carol. O órgão também pediu a condenação das empresas em um total de R$ 10,6 bilhões por danos sociais e ambientais.
Segundo a denúncia, a Ourominas e as demais DTVMs declararam ter comprado ouro de áreas que nunca foram exploradas, ocultando a origem ilegal do minério.
Segundo o MPF, embora atrelado formalmente a autorizações situadas na região de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso, no Pará, o ouro comercializado pela Ourominas passou por esquentamento: O ouro extraído de garimpos ilegais – como reservas indígenas, por exemplo – foi informado pela DTVM com origem em áreas de garimpos legalizados, o que permitiu o comércio dentro e fora do país como se fosse de origem legal e pode ser oriundo de qualquer garimpo ilegal na Amazônia, “como as Terras Indígenas Munduruku, Kayapó, Yanomami, Raposa Serra do Sol, os Rios Madeira, Jutaí, Içá e Japurá”.
A Justiça chegou a impor o bloqueio de R$ 72 milhões da Ourominas, mas não julgou o pedido de suspensão das atividades da empresa no mercado financeiro. A Ourominas recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região para suspender o bloqueio dos valores, e aguarda julgamento.
Caminho dourado
O dossiê do Instituto Escolhas “Raio-x do Ouro”, publicado em fevereiro deste ano, traçou um panorama das empresas envolvidas com indícios de ilegalidades na compra de ouro extraído de garimpos ilegais da Amazônia.
O relatório mostra as conexões dos membros da família Silva, como o candidato Beto Ourominas, e as relações das diversas empresas ligadas à cadeia do ouro.
O documento permite comparar semelhanças entre as empresas investigadas e suas atuações institucionais e políticas. A exemplo da Ourominas e da Abramp, outra investigada, a FD’Gold, mantém relações parecidas com a Agência Nacional do Ouro (Anoro), igualmente apontada como braço do lobby do setor em Brasília.
Em junho do ano passado, uma reportagem da Amazônia Real em conjunto com a Repórter Brasil também mostrou as relações da Ourominas e da FD’Gold na compra de ouro ilegal da Terra Indígena Yanomami.
A FD’Gold e a Anoro são comandadas por Dirceu Santos Frederico Sobrinho, preso recentemente na operação Aerogold, que investiga exploração ilegal por balsa e dragas nos rios da Amazônia. Dirceu também atua em toda a cadeia do minério, da exploração ao comércio internacional.
Outro irmão de Beto apontado no levantamento do Instituto Escolhas é Roselito Soares da Silva Filho, que também tem um dos postos da rede de atendimento da Ourominas DTVM, em Itaituba, e duas holdings, em São Paulo e Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, a Maison Prime, que está envolvida na construção de uma refinaria de ouro em Belém (PA). Um dos sócios dessa obra já foi condenado por lavagem de dinheiro na Bélgica.
Segundo o relatório, Roselito ainda está vinculado a duas empresas que exportam metais preciosos, a Omex, que também é sócia na construção da refinaria, e a Ourominas Joias. Apesar de não estar citada diretamente, a Abramp comandada por Beto Ourominas emitiu uma nota de repúdio contra os levantamentos do Instituto Escolhas.
Ao InfoAmazonia, a Ourominas afirmou que não apoia Beto Ourominas ou qualquer candidato nesta eleição. Apesar de ter sido um dos fundadores e ser irmão do dono da empresa, a Ourominas DTVM diz que não há nenhuma relação entre o candidato e a empresa.
“Certamente existem também no Brasil outras empresas de segmentos distintos registradas com a razão social ou nome fantasia de Ourominas”, disse a empresa.
A empresa também disse que não há relação entre a Ourominas DTVM e o site Omind, mas não explicou porque o portal anuncia barras de ouro e cartões produzidos pela empresa.
Gostaria d da umas informacoessobre ouro minas
Trabalhei para essa emprwsa em sao paulo.