Impulsionados por uma profusão de cliques e remunerados pelas ferramentas de monetização, canais do YouTube com viés de direita se empenham em difundir desinformação sobre Amazônia, mudanças climáticas e sociobiodiversidade brasileira. Uma das principais fontes da desinformação veiculada por esses canais é o Palácio do Planalto. 

Esse é o resultado da análise realizada pelo projeto  “Amazonas: mentira tem preço”, que mapeou mais de 400 vídeos no YouTube, com cerca de 70 milhões de visualizações e 67 milhões de interações. 

Discursos mentirosos ou distorcidos do presidente e dos filhos 01 e 02, com 5,2 milhões de usuários, e de ministros do primeiro escalão são replicados em um exército de canais pró-governo, com milhares de seguidores, que afirmam fazer jornalismo independente. Nesse time, estão ainda youtubers negacionistas e revisionistas alinhados ao discurso presidencial.  Dos canais analisados, cinco integram a lista dos 14 punidos pelo Tribunal Superior Eleitoral por suspeita de disseminar desinformação sobre o sistema eleitoral. Os vídeos deles seguem no ar.  São eles: Folha Política, Te atualizei, Vlog do Lisboa, Ravox e Emerson Teixeira. 

“O YouTube, sem dúvida, é o grande protagonista da desinformação e o centro de produção. Em uma analogia com o tráfico de drogas, é como se os aplicativos fossem os aviõezinhos e o YouTube a boca de fumo”, afirma Leonardo Nascimento, pesquisador em redes de desinformação e professor  da Universidade Federal da Bahia. “É uma logística de produção industrial de desinformação.” 

A pedido do projeto Amazonas: mentira tem preço, a  empresa Novelo, que pesquisa desinformação, usou algoritmos de automação e análise de dados para encontrar os vídeos, em canais favoráveis ao presidente Jair Bolsonaro (PL), com temática socioambiental mais vistos desde a posse, em 2019. A lista, então, foi verificada, descartando os que apenas mencionam palavras-chaves mas não versam sobre o assunto, como a palavra Amazônia relacionada ao nome de um programa televisivo.  

O projeto “Amazonas: mentira tem preço” questionou o Youtube sobre os vídeos analisados. Em resposta, a assessoria da plataforma informou que  alguns foram excluídos e, outros, desmonetizados, sem especificar quais. Informações falsas deveriam ser retiradas do ar, mas essa “peneira” do Youtube não tem se mostrado muito eficaz para filtrar a desinformação usada para ganhar dinheiro, sendo alvo de críticas

Em janeiro deste ano,  em carta aberta à CEO da plataforma Susan Wojcicki, mais de 80 organizações de checagem de fatos no mundo todo, classificaram o YouTube como “um dos principais canais de desinformação e de propagação de informações falsas online em todo o mundo.” O documento diz ainda que ações contra as fake news foram insuficientes e sugere uma série de recomendações para combater os propagadores de desinformação, como desmonetização  de conteúdo.

Os Bolsonaro pelo garimpo em terras indígenas

Foto: Christian Wiediger / Unsplash

Com 3,6 milhões de inscritos em seu canal do Youtube, o presidente Jair Bolsonaro é um dos principais difusores de desinformações sobre a temática socioambiental e a Amazônia na plataforma. O presidente aparece com 32 vídeos de seu próprio canal, que somam 4.626.547 visualizações. Os vídeos postados, em sua maioria, são as lives semanais que ele também transmite pelo Facebook. 

O conteúdo gerado pelo presidente abastece outros canais, que replicam e reforçam seu discurso. O nome Bolsonaro aparece em 177 títulos dos vídeos analisados. 

No dia 08 de agosto de 2019, em uma de suas lives semanais, acompanhado de Ricardo Salles, então ministro do Meio Ambiente, Bolsonaro recebe dois indígenas de Roraima e aproveita para fazer a defesa da mineração em terras indígenas. “Tem um pessoal que usa o índio como massa de manobra, pra demarcar cada vez mais terra. Pra deixar ele isolado como se fosse um ser aí, um neanderthal”, disse  Bolsonaro, de forma preconceituosa.

O governo Bolsonaro não demarcou nenhuma terra indígena, o que aumenta a insegurança no campo e, assim, o número de invasões, assassinatos e ameaças contra comunidades.  O vídeo postado no canal oficial de Bolsonaro alcançou 52.560 visualizações. O trecho do vídeo em que Bolsonaro recebe os indígenas foi também postado no canal Folha Política e alcançou mais 218.356 visualizações

Em outro vídeo, que ultrapassou 74 mil visualizações, o presidente postou um discurso de seu secretário nacional de Assuntos Fundiários, Luiz Antonio Nabhan Garcia, durante uma visita a Roraima. “Nossos irmãos índios de todo o Brasil querem trabalhar, plantar, garimpar, enfim serem como nós”, escreveu Bolsonaro na descrição do vídeo. Boa parte da terra indígena Yanonami fica em Roaraima, invadida por mais de 20 mil garimpeiros ilegais, segundo a Hutukara Associação Yanomami.  

Cercado de alguns representantes de comunidades indígenas no estado, Garcia, que é ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR), diz estar  “traduzindo o que pensam as comunidades indígenas de todo o Brasil” e que “os índios querem fazer o garimpo do ouro das suas terras, do diamante, dentro da legalidade”, na contramão do que defendem organizações nacionais que representam os povos indígenas no país, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Uma das notas sobre a escalada de violência em território Yanomami diz que a Apib “vem a público manifestar extrema indignação e preocupação diante da escalada da violência cometida por garimpeiros contra comunidades indígenas da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, e a negligência com que a situação vem sendo tratada pelo poder público.”

Em fevereiro de 2020, o governo federal apresentou o Projeto de Lei 191/20  com o objetivo de regulamentar a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em terras indígenas. O PL 191, como ficou conhecido, voltou à pauta com outra fake news do governo, que afirma que a produção de potássio para fabricação de fertilizantes depende da liberação do PL, quando 89% das jazidas estão fora das terras indígenas, segundo pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais.  O Ministério Público Federal, em nota, afirmou que o PL é inconstitucional. O Instituto Brasileiro de Mineração,  associação de grandes mineradoras, também se posicionou contra por entender que o PL 191 “não é adequado para os fins a que se destina”.  

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o 01, com mais de 380 mil inscritos em seu canal, postou um discurso do presidente em defesa do garimpo feito durante a inauguração, em 2021, de uma ponte de madeira em São Gabriel da Cachoeira (AM). A viagem custou mais do que o dobro do valor utilizado para a construção da ponte, mas esta informação não aparece no vídeo, com cerca de 68 mil views.   

CONFIRA: Quem é o “novo índio” da “nova Funai” no governo Bolsonaro?

No canal do 02, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o discurso pró-exploração, com mais de 464 mil visualizações, aparece na voz de Richard Rasmussen,  biólogo, apresentador e embaixador do Ecoturismo Brasileiro, que dá um verniz de especialista ao defender uma posição política do governo do qual faz parte. Entrevistado pelo filho do presidente, Rasmussen afirma que  “seria burrice não aproveitar uma Amazônia preservada, tem muita riqueza lá”, quando uma área equivalente à metade do estado de Sergipe foi destruída na Amazônia em 2021. “Quando se fala da questão ambiental, precisamos entender que existe uma intenção política por trás da divulgação orquestrada de fake news sobre esse tema. É, também, uma manobra política. O uso de estratégias desinformativas como tática de guerra não é algo novo”, afirma Nina Santos, pós-doutoranda no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital.

Para o advogado e pesquisador da Universidade de Oxford, Caio Machado, que também é presidente e co-fundador do Instituto Vero,  grandes empresários, políticos, fazendeiros, grileiros e garimpeiros, além do próprio criador do conteúdo, representam a maior parcela dos beneficiados com narrativas enganosas. “O que dá dinheiro nas plataformas é o tempo de atenção do usuário, views, compartilhamentos, cliques, comentários, likes… é o que dá ibope. Existem várias formas de se beneficiar. Tem todo um mercado de cliques de desinformação pelo engajamento. Esse mercado acaba sendo conivente e tem quase uma simbiose com a desinformação.” 

Segundo as regras do YouTube, para ser remunerado com a ferramenta de monetização, o canal precisa ter pelo menos mil inscritos e quatro mil visualizações nos últimos 12 meses. Ao atender esses requisitos e seguir as demais diretrizes da plataforma, a recompensa varia de US$ 0,25 a US$ 4,50 a cada mil visualizações, algo entre R$ 1,30 e R$ 24.

“O Youtube, sem dúvida, é o grande protagonista da desinformação e o centro de produção. Em uma analogia com o tráfico de drogas, é como se os aplicativos fossem os aviõezinhos e o YouTube a boca de fumo.”

Leonardo Nascimento, pesquisador em redes de desinformação e professor  da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Rede de canais alinhados ao governo

Foto: Viktor Szabo / Unsplash

“O papel das pessoas [que curtem e compartilham os vídeos desses canais] é essencial para fazer com que esse conteúdo viralize e chegue à maior quantidade de pessoas, mas a gente não pode igualar o papel que elas têm com o papel de uma orquestração para disseminação das fake news, as operações desinformativas. Aí estamos falando de outro nível de organização que tem a ver com o espalhamento de um conteúdo padrão que está sendo divulgado por diversos atores digitais”, afirma a pesquisadora Nina Santos.

Discursos negacionistas ganham potencial para viralizar com o estímulo de Bolsonaro e seus apoiadores. Além de gerar conteúdo para esses canais por meio de seus discursos, o presidente também atua na outra ponta, replicando o conteúdo produzido por esses canais.

“O canal faz o vídeo, o presidente vai lá e responde. Gera uma onda gigantesca com a replicação. O simples interesse da narrativa pode render receita direta para os canais, como o financiamento por empresas do agro, ou indiretamente, com a replicação desses vídeos e a remuneração pelo YouTube. E geralmente é tudo ao mesmo tempo”, diz  Caio Machado, do Instituto Vero.

Com 2,6 milhões de seguidores, o canal Folha Política, investigado em inquérito do STF (Supremo Tribunal Federal) que apura a organização de atos antidemocráticos, está entre os principais difusores de desinformação sobre a Amazônia. Em geral, os vídeos distribuídos pelo canal são gerados por emissoras públicas, como a TV Brasil e a TV Câmara. Nos primeiros 30 segundos de seus vídeos, apresenta ao internauta a seguinte mensagem: “assista ao vídeo e deixe o seu ‘like’ se você apoia o governo Bolsonaro”.

Os vídeos mostram mensagens supostamente patrióticas, que repetem elementos bastante comuns no discurso dos apoiadores de Bolsonaro, como a importância da Amazônia para a tese ilusória e fictícia sobre a “defesa da soberania nacional”, ou teorias da conspiração, como a que diz que, por trás do interesse em preservar, há governos estrangeiros aliados a ONGs internacionais para dominar a Amazônia e acabar com essa “soberania”. 

Para além da reprodução dos discursos do presidente que desinformam, estão os do general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), do deputado Coronel Chrisóstomo (União Brasil-RN) e do comandante do Exército, general Edson Pujol. 

O vídeo do comandante do Exército reproduzido pelo canal alcançou mais de 800 mil visualizações. “Aos incautos que insistem em tutelar os desígnios da Amazônia não se enganem, os soldados do exército de Caxias estarão sempre atentos e vigilantes, prontos para defender e repelir qualquer tipo de ameaça”, diz Pujol.  Outro vídeo, de agosto de 2019, ultrapassou 1 milhão de views sugerindo que o desmatamento é um discurso inventado, quando dados do próprio governo mostram que o Brasil bateu três recordes consecutivos de desmatamento nos três primeiros anos de governo Bolsonaro. A legenda atribui uma fala ao presidente: “não é à toa que outros países tentam ganhar a guerra da informação para que nós venhamos a perder a soberania sobre essa área”.

O Folha Política também fez barulho ao distribuir um vídeo postado por Bolsonaro resgatando uma fala do falecido deputado Enéas Carneiro, do extinto Prona. “O problema é que, por exemplo, na região Yanomami não na superfície, mas no subsolo, estão riquezas imensuráveis. O problema é que lá na floresta amazônica está o futuro do planeta. É de lá que sairá a cota energética que movimentará o mundo. Isso é que está escondido por trás da gritaria ecológica”.

Outra artimanha bastante comum nos vídeos que abordam temas socioambientais dos canais analisados é confundir, seja com apresentação de dados falsos ou descontextualizados, ou com a distorção de resultados de pesquisas. “Há essa apropriação ou deturpação de dados científicos que parecem ou, até mesmo, são verdadeiros. As fake news se apoiam em discursos e conhecimentos que já estão circulando na sociedade e isso é muito importante para dar credibilidade”, afirma a pesquisadora Nina Santos.

Frases de efeito com informações falsas ou negacionistas são o carro chefe de vídeos da produtora Brasil Paralelo, com 2,44 milhões de inscritos na plataforma, em destaque na lista analisada com vídeos que divulgam um documentário dedicado a isso. “A Amazônia não está em chamas, a agricultura não é a causadora dos males da questão ambiental no Brasil”, diz o professor e cientista-político Christian Lohbauer,  candidato a vice-presidente da República em 2018, em um vídeo com menos de 50 segundos e  mais de 100 mil visualizações

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Estudos de cientistas brasileiras mostram que o desmatamento tem sido o principal agente das queimadas da Amazônia e não as secas.

“O fogo se deve sobretudo ao desmate ilegal para extração de madeira e formação de pastos em terras públicas griladas. A soja também tem entrado nos últimos anos”, afirmou a pesquisadora Sonaira da Silva, do Laboratório de Geoprocessamento Aplicado ao Meio Ambiente (LabGama) da Universidade Federal do Acre em entrevista para o InfoAmazonia.

Levantamento exclusivo realizado pelo InfoAmazonia entre julho e setembro de 2021 revelou que a maior incidência de focos de incêndio na floresta em territórios com povos indígenas isolados aconteceu na Terra Indígena Inãwébohona, no Tocantins, e no Parque Nacional Indígena do Xingu, no Mato Grosso , que concentraram mais da metade dos focos de calor entre as terras demarcadas com indígenas isolados. A agropecuária é vizinha dos dois territórios. 

Em outro, com mais de 50 mil visualizações, o controverso antropólogo Edward Luz, detido por tentar impedir o trabalho do Ibama , afirma que as “ONGs no Brasil plantam indígenas para colherem benefícios financeiros posteriores.” O discurso é corrente entre os apoiadores do governo Bolsonaro que atuam na área da comunicação.

Os vídeos de Christian Loubauer e Edward Luz foram postados a título de divulgação do documentário longa-metragem disponibilizado na íntegra pelo canal, vídeo que está ultrapassou a marca de 2 milhões de visualizações.

“As fake news se apoiam em discursos e conhecimentos que já estão circulando na sociedade e isso é muito importante para dar credibilidade”

Nina Santos, pós-doutoranda no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital

O canal Foco do Brasil, que reúne 2,69 milhões de seguidores, alcançou  384 mil visualizações com um vídeo em que o presidente afirma que a Amazônia não pega fogo “porque é úmida”. “Nem se você pegar um fósforo, álcool…”, afirmou Bolsonaro a um grupo de apoiadores no “cercadinho” na entrada do Planalto, por volta dos 11’56” do vídeo. Dados oficiais do governo desmentem o presidente.  

O canal Te Atualizei, punido pelo TSE, com 1,44 milhões de inscritos, isenta Bolsonaro sobre o elevado índice de desmatamento na Amazônia e, em um vídeo postado em agosto de 2019, atribui as queimadas ao “fenômeno natural da seca”, versão refutada por pesquisadores.  

Com o título “A real sobre a Amazônia”, linguagem descontraída e edição com direito a efeitos visuais, o vídeo teve mais de 437 mil visualizações. Vale lembrar que, na ocasião, a área desmatada na Amazônia foi de 9.762 km² entre agosto de 2018 e julho de 2019, de acordo com o Inpe, um aumento de 29,5% em relação ao mesmo período dos anos anteriores. 

O canal RC Interativa também aderiu ao discurso bolsonarista de que existe uma conspiração internacional sobre a Amazônia.

Brechas na regulação

Para a pesquisadora Nina Santos, os mecanismos de autorregulação das plataformas (ou seja, o fato de elas determinarem as regras de combate aos conteúdos inverídicos) não são suficientes para combater esse processo desinformativo. “Acabamos ficando na mão das decisões dessas empresas sobre o que pode e o que não pode no debate público. Precisamos ter algum tipo de instrumento externo”, defende. 

O Projeto de Lei 2.630, conhecido como PL das Fake News, que foi aprovado na Câmara dos Deputados e aguarda votação pelo Senado, pode ocupar um vácuo regulatório, segundo Machado, e trazer soluções, como  expor a promoção de debates sobre estratégias de moderação e remoção de discursos de ódio. 

“A gente gerencia. É como o tráfico de drogas, você combate. Tem que deixar muito caro para quem quer fazer, ajustando a legislação e a regulação. A desinformação opera através de alguns mecanismos, não só a produção da história, mas o escoamento, a narrativa, os mecanismos de viralização… a lei tem que olhar para todos esses aspectos.” 

Por outro lado, um artigo do PL que trata sobre rastreabilidade é apontado por ele como a maior (mas não única) falha do documento. “Para esse artigo funcionar, vamos ter que reter as conversas de todo mundo para chegar em quem começou uma corrente. E, mesmo assim, com a figura do ‘copia e cola’ você inicia uma nova conversa e perde o fio. É muito agressivo porque promove a retenção em massa de conversas, o que é perigoso”. 

YouTube afirma que vídeos que descumprem regras são excluídos ou perdem monetização

A reportagem encaminhou ao YouTube os links dos vídeos descritos nesta matéria e, após análise da plataforma, alguns deles foram excluídos, enquanto outros foram retirados do programa de monetização. No entanto, nem todos os vídeos listados faziam parte do programa de monetização, apontou a plataforma.

Em nota, o YouTube afirma que criou regras para a disseminação de informações ligadas à Covid-19. Também atualizou as políticas de monetização e anúncios e passou a proibir a remuneração de conteúdos negacionistas sobre as mudanças climáticas. Mas para vídeos que neguem desmatamento e queimadas, motores da crise do clima no Brasil, aparentemente a diretriz não vale.  Leia a íntegra aqui. 

O documento diz ainda que a plataforma conta com um mapeamento eletrônico e humano para encontrar vídeos em desacordo. De julho a setembro de 2021, o sistema removeu 6 milhões de vídeos em todo o mundo, e pelo menos 420 mil no Brasil. As denúncias de usuários resultaram na remoção de 233 mil vídeos. Ainda de acordo com o YouTube, os conteúdos publicados na plataforma precisam seguir as diretrizes da comunidade que, entre outras práticas, proíbem a disseminação de desinformação. Caso sejam descumpridas ou se aproximem do que chamaram de “limite das políticas”, podem resultar na retirada daquele vídeo do programa de monetização ou, até mesmo, no fechamento de um canal. “A desinformação corrói a confiança do público e dos anunciantes”, diz um trecho da nota, que atribui a fala ao diretor de produto do YouTube, Neal Mohan.

Outro lado

O InfoAmazonia entrou em contato com todos os canais cujos vídeos foram citados e os políticos cujos depoimentos em vídeo foram registrados nesta reportagem.

Os responsáveis pelos canais “Jair Bolsonaro”, “Flavio Bolsonaro”, “Eduardo Bolsonaro”, “Ravox” e “Vlog do Lisboa”, a Empresa Brasil de Comunicação, responsável pela TV Brasil, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Augusto Heleno, o secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Luiz Antônio Nabhan Garcia, o general do Exército brasileiro Edson Pujol, o deputado federal Coronel Chrisostomo, o professor Christian Lohbauer e o biólogo Richard Rasmussen foram procurados pela reportagem para prestar esclarecimentos mas não responderam.

Brasil Paralelo

Em nota enviada à repotagem, a produtora Brasil paralelo diz que “a afirmação de que o documentário Cortina de Fumaça faria parte de uma lista de vídeos ‘com desinformações sobre a Amazônia’ é mentirosa”.

“Todos os documentários da Brasil Paralelo passam por uma longa gestação, extensas pesquisas e aprofundamento sobre os temas antes de se iniciar a produção. Cortina de Fumaça traz fatos que são confirmados com dados e reportagens, com fontes apresentadas no próprio filme”.

A produtora afirma buscar sempre entrevistados qualificados, justificou a participação de Christian Lohbauer e Edward Luz devido a trajetória acadêmica de ambo: Lohbauer é mestre e doutor em Ciência Política pela USP, professor, especialista em defensivos agrícolas, com extensa e reconhecida carreira na indústria agropecuária. Participou da fundação e foi candidato a vice-presidente da República pelo partido Novo nas eleições de 2018. Edward Luz é Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília, Mestre em Antropologia Social e doutorando em Ciências Sociais pelo Centro de Pesquisa e Pós-Graduação para as Américas e Caribe pela mesma instituição.

“Os dois entrevistados estão entre outros que trazem grande diversidade de opiniões e visões de mundo para abordar o tema. Além disso, foram ouvidas lideranças indígenas, fundadores de ONGs, jornalistas, entre muitos outros nomes importantes para um debate qualificado e plural”.

A produtora Brasil paralelo afirma que seu canal não é monetizado e nunca fo, questionou os critérios utilizados pela reportagem do projeto Amazônia: Mentira Tem Preço.

“Questionamentos sobre alguma informação ou dado relatado na obra são sempre bem-vindos, mas devem ser apresentados de forma objetiva, e não com acusações de ‘desinformação’ genéricas e ideológicas. Nesse sentido, vale lembrar de recente decisão judicial em favor da Revista Oeste, também acusada de fakenews de forma irresponsável. Caso a mesma prática ocorra em relação à Brasil Paralelo, tomaremos as providências para que os danos sejam reparados”. Leia a íntegra da nota.

Emerson Teixeira

O professor Emerson Teixeira, do canal “Emerson Teixeira” no YouTube, afirmou que o conteúdo de seus vídeos são checados por ele mesmo, “baseado em fatos e não em opiniões”, e que não recebe dinheiro pelo canal. “Sou funcionário público e não dependo do canal”, disse, por email. Sobre a decisão do TSE que suspendeu a monetização de seu canal e de outros canais bolsonaristas, por postarem conteúdos ofensivos à democracia e ao sistema eleitoral, Emerson afirma que nunca publicou “fake news” e que as provas de seu delito nunca foram mostradas a ele. “Sou perseguido político por ter apoiado o presidente”, afirmou.

TV Câmara

A Câmara dos Deputados, responsável pela operação da TV Câmara, afirmou em nota que o conteúdo exibido na televisão e no canal do YouTube “pode ser reproduzido e divulgado na íntegra e distribuído de forma não comercial por quaisquer meios de comunicação” e que não é permitido “editar ou alterar o conteúdo”. Sobre o conteúdo dos discursos parlamentares, a assessoria afirma que “conforme o artigo 53 da Constituição Federal, os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Ainda segundo a nota, o canal da Câmara no YouTube “não recebe por visualizações e não é monetizado”. 

Folha Política

Ernani Fernandes Barbosa Neto e Thais Raposo do Amaral Pinto Chaves, responsáveis pelo canal Folha Política no YouTube, não retornaram aos pedidos de entrevista enviados por meio dos contatos divulgados nas redes sociais e associados às empresas controladas pelos dois, Novo Brasil Empreendimentos Digitais LTDA e Raposo Fernandes Marketing Digital LTDA. 

RCTV Interativa Oficial

Procurado por telefone, o jornalista Roberto Carlos de Jesus Oliveira, responsável pelo canal RCTV Interativa Oficial, afirmou que a maior parte da renda do canal vem de apoiadores locais da região metropolitana de São Paulo e contratos com prefeituras locais para cobrir eventos. “Se eu fosse viver de monetização no YouTube eu estaria passando fome.” Sobre a natureza jornalística do canal RCTV, Roberto Carlos é vago. “É difícil você dar uma conotação, ‘o meu canal é de opinião’, ‘o meu canal é de informação’… depende. Depende do ponto de vista. A minha verdade pode não ser a de muita gente”, afirma o jornalista. “Falar de jornalismo no Brasil hoje é muito complexo. Mas ainda sim o Brasil, por mais que tenha essa dificuldade, ainda é um país em que você pode se manifestar.”

Te Atualizei 

Barbara Zambaldi Destefani, responsável pelo canal, foi procurada pelos telefones e emails associados à sua empresa, B&P Produção Cinematográfica LTDA, e pelos emails divulgados em seu perfil do YouTube e nas redes sociais. Não respondeu.  

Ravox

O youtuber Adilson Nelson Dini respondeu à reportagem por email e afirmou que seu antigo canal, Ravox Brasil, foi extinto. Sobre seu novo canal, com o mesmo nome, criado em julho de 2021 e utilizado após a punição do TSE, assinada no dia 16 de agosto pelo ministro Luis Felipe Salomão, Dini admite ter feito “uma autocrítica” a respeito do conteúdo que publicava. “Procuramos achar as falhas, erros, fazer uma autocrítica e consertar”, afirmou. “Somos absolutamente contra fake news.” Adilson Dini disse também que a única renda que tinha com o canal era do “programa de parcerias do YouTube” e garantiu que nunca recebeu dinheiro do governo federal. 

YouTube

Sobre o conteúdo desta repotagem, o YouTube afirmou que “o caso em questão está sob análise”.

“Todos os conteúdos no YouTube precisam seguir nossas Diretrizes de Comunidade, e contamos com uma combinação de inteligência de máquina, revisores humanos e denúncias de usuários para identificar material suspeito e agimos rapidamente sobre aqueles que estão em desacordo com nossas políticas assim que são localizados. Qualquer pessoa que acredite ter encontrado um conteúdo no YouTube em desacordo com as nossas diretrizes pode denunciar o vídeo ou o canal por meio da plataforma. Quando não há violação à política de uso do YouTube, a análise final sobre a necessidade de remoção de conteúdo cabe ao Poder Judiciário, nos termos do Marco Civil da Internet.”

*Colaborou Rafael de Pino

**Publicação atualizada às 11h do dia 14 para inclusão da nova resposta da produtora Brasil Paralelo.

***Publicação atualizada às 09h35 do dia 16 para inclusão da resposta do canal Ravox.

****Publicação atualizada às 12h13 do dia 19 para inclusão da resposta do YouTube.

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