Dois frigoríficos e três pessoas foram condenados ao pagamento de R$ 4,2 milhões por desmatamento ilegal para criação de gado dentro da Reserva Extrativista Jaci-Paraná.
A Justiça de Rondônia condenou dois frigoríficos — Distriboi e Frigorífico Irmãos Gonçalves — e três pessoas — Célio Rodrigues de Oliveira, Cleyton Pinho Araújo e Darcimar Casteluber Sabaini — ao pagamento de R$ 4,2 milhões por desmatamento e exploração ilegal de gado dentro da Reserva Extrativista Jaci-Paraná, em Porto Velho.
A decisão, publicada na quinta-feira (5), é assinada pela juíza Inês Moreira da Costa, da 1ª Vara de Fazenda Pública, e ordena a retirada do gado da área da reserva, além da destruição de todas as instalações e obras, construídas para atender às atividades ilegais.
A sentença da Justiça afirma que os frigoríficos adquiriram e comercializam gado criado ilegalmente dentro da Resex Jaci-Paraná. Já os réus Célio Rodrigues de Oliveira, Cleyton Pinho Araújo e Darcimar Casteluber Sabaini, segundo a decisão, atuaram como ocupantes e arrendatários da área, desmatando diretamente florestas nativas para viabilizar a abertura de pastagem na região.
A condenação foi fundamentada em relatórios técnicos que utilizaram imagens de satélite para mostrar o desmatamento progressivo ao longo dos anos. As imagens foram anexadas ao processo.
“As imagens falam por si. Houve uma destruição quase que total da Reserva Extrativista de Jaci-Paraná, com significativos danos ambientais, que serão analisados mais adiante, e que não podem deixar de ser objeto de atenção e rigor de todas as autoridades responsáveis”, destacou a magistrada.
A condenação e os principais pontos da decisão
1. Desocupação da reserva e demolição de construções
O primeiro ponto da sentença exige a desocupação imediata da Reserva Extrativista Jaci-Paraná. Os ocupantes ilegais devem ser removidos e todas as construções e benfeitorias erguidas sem autorização serão demolidas. O tribunal determinou que essa remoção deve ocorrer sob pena de multas substanciais caso os réus não cumpram a ordem judicial.
2. Indenizações milionárias pelos danos ambientais
Os requeridos foram condenados ao pagamento de três indenizações relacionadas a danos ambientais na Resex Jaci-Paraná: R$ 2.526.326,34 pelos danos materiais diretos; R$ 1.263.163,17 pelos danos materiais intercorrentes; e R$ 465.000,00 por dano moral coletivo, valor que será destinado ao Fundo Estadual do Meio Ambiente, sob fiscalização do Ministério Público, para a recuperação dos danos na reserva. Esses valores totalizam R$ 4.254.489,51 em multas aos invasores.
3. Retirada de animais
Os réus também foram condenados a retirar todos os animais que foram introduzidos ilegalmente na área protegida. O uso dessas terras para a criação de gado foi considerado uma violação severa das normas de preservação ambiental. O tribunal estipulou multas de 1% ao mês sobre cada um dos três valores das penalidades em caso de não cumprimento das determinações.
A Resex Jaci-Paraná está entre as unidades de conservação mais desmatadas da Amazônia. Quando foi criada, em 1996, 99% de seus 197 mil hectares eram cobertos por floresta. Ela é destinada ao uso sustentável da população agroextrativista que vive na região, mas, em 2024, apenas 34% de seu território está preservado, abrigando mais de 200 mil cabeças de gado.
A região começou a sofrer as primeiras invasões no início dos anos 2000, com a expansão do agronegócio em Rondônia. Proclamando-se donos das terras, os invasores expulsaram os extrativistas. Desde então, o gado ilegal se multiplica dentro da área.
Réus alegam conivência do Estado
Durante o processo, a defesa dos réus argumentou que a terra poderia ser regularizada, alegando direitos fundiários sobre a área ocupada. Os invasores chegaram a afirmar que o próprio governo estadual tinha conhecimento da ocupação e emitiu guias de trânsito animal (GTAs: A Guia de Trânsito Animal (GTA) é o documento oficial para o transporte de animais no Brasil e contém informações essenciais sobre a rastreabilidade (origem, destino, finalidade, espécie, vacinações, entre outros). O documento é uma exigência em contratos internacionais para assegurar que os animais estão livres de pragas e doenças.) para o transporte de gado para os frigoríficos da região.
Uma reportagem da InfoAmazonia, publicada em 2022, já havia mostrado como o governo de Rondônia mantinha o controle sanitário do gado ilegal dentro da reserva, realizando inclusive a vacinação dos animais. Além disso, a Agência de Defesa Sanitária e Agropastoril de Rondônia (Idaron) chegou a produzir relatórios com dados das fazendas e dos seus ocupantes para manter o controle dos animais. A lista de proprietários de fazendas dentro da reserva inclui empresários e até funcionários públicos.
O governador do estado, Marcos Rocha (Solidariedade), foi um dos defensores da regularização da agropecuária na área protegida. Em 2020, o governador disse que Rondônia tem “excesso de reservas” e prometeu atuar junto com o então governo Bolsonaro para reduzir essas áreas e avançar com a regularização fundiária.
Em 2021, Marcos Rocha chegou a sancionar a Lei Complementar 1.089/21 que reduziu os limites da reserva para 45 mil hectares. Em 2023, a lei foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Na sentença, a juíza Inês Moreira da Costa deixou claro que as reservas extrativistas são de domínio público, conforme previsto na Lei nº 9.985/00, e devem ser usadas exclusivamente por populações extrativistas tradicionais. Os réus, portanto, não têm direito à regularização fundiária nem à utilização da área para criação de gado, atividade considerada incompatível com o status de conservação da reserva.
A Justiça também decretou a suspensão de incentivos fiscais e o bloqueio do acesso dos réus a linhas de financiamento em instituições de crédito até que os danos ambientais sejam totalmente reparados. O Banco Central do Brasil será notificado para comunicar a decisão a todos os bancos do Sistema Financeiro Nacional.
A InfoAmazonia identificou que pelo menos uma fazenda dentro da Resex já foi beneficiada com crédito rural, principal programa do governo federal para o agronegócio.
O mesmo de sempre. Reforma agrária não é possível de fazer, mas pro agro boi/ soja pode tudo .
Vergonha governador.
Belo trabalho da juíza nesse caso punindo conforme a lei, fica o questionamento também perante os fatos relatados sobre a influência e a conivência de servidores e órgãos públicos. Sobre os servidores seria dever buscá-los e responsabilizá-los sobre tais atos inclusive com a exoneração do cargo. Outro fator seria o aumento desta multa, se esses fazendeiros têm mais de 200 mil cabeças certamente conseguiriam arcar com uma multa de dezenas de milhões.
O agronegócio destruindo florestas …com aval de poderosos q estão no poder ..e que se dizem cristãos