Uma área equivalente ao tamanho da cidade de São Paulo foi desmatada na Amazônia apenas em julho de 2022. Pará lidera o ranking mensal, no entanto, o acumulado do ano mostra liderança inédita do Amazonas. Estimativas apontam que a taxa anual de desmatamento no bioma será a maior desde 2006.

Nos anos de 2020, 2021 e 2022, os meses de julho do governo Bolsonaro contabilizam, juntos, 4.600 km² de floresta derrubada, um número quase 160% maior do que o registrado entre 2016 e 2018, os três anos comandados por Dilma Rousseff (PT) e, depois, Michel Temer (MDB) — naquela época, a soma foi de 1.800 km². 

Esses dados foram extraídos do Deter: Ferramenta do governo federal que gera alertas rápidos para evidências de alteração da cobertura florestal na Amazônia e no Cerrado, sistema de alertas de desmatamento: eliminação total da vegetação nativa numa determinada área seguida, em geral, pela ocupação com outra cobertura ou uso da terra do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O PlenaMata optou por fazer a comparação entre os três últimos anos de cada gestão— no lugar de 4 anos, todo o mandato — porque o sistema atual do Inpe passou a ser contabilizado a partir de 2016. Mas se considerarmos o ano que fica de fora da comparação, esse número cresceria ainda mais pois 2019 teve o pico de alertas de desmatamento desde o início da série histórica (2.255 km2). 

“A gente continua sem política de combate às derrubadas, o Fundo Amazônia permanece congelado e as multas ambientais continuam não sendo cobradas. Logo, esses números de alertas seguem sendo moldados ao gosto dos desmatadores, madeireiros ilegais, grileiros e garimpeiros. São eles que hoje determinam o quanto de floresta vai ser desmatada, porque o governo não tem, praticamente, ação para coibir isso”, explica Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.

A gente continua sem política de combate às derrubadas, o Fundo Amazônia permanece congelado e as multas ambientais continuam não sendo cobradas. Logo, esses números de alertas seguem sendo moldados ao gosto dos desmatadores, madeireiros ilegais, grileiros e garimpeiros.

Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima

Apenas em julho deste ano, uma área de floresta equivalente ao tamanho da cidade de São Paulo (quase 1.500 km²) foi ao chão na Amazônia, segundo os dados do Deter. O número é 1,5% menor do que o registrado no mesmo período do ano passado, mas segue elevado, sendo o quinto pior mês entre os 84 meses que formam a série histórica da detecção. Essa tímida redução nos dados neste ano está dentro da margem de erro, resultando, portanto, em empate técnico com julho de 2021. 

Os três úlitmos meses de julho do governo Bolsonaro contabilizam, juntos, 4.600 km² de floresta derrubada – quase 160% a mais do que o registrado entre 2016 e 2018. 2019, primeiro ano do atual governo, teve o pico de alertas de desmatamento desde o início da série histórica (2.255 km² desmatados).

Clima favorece o desmate

Apesar desse empate técnico, julho foi o mês mais desmatado de 2022 na Amazônia, com aumento de quase 33% em relação a junho, até então o mais devastado do ano. Tradicionalmente, julho tem os piores índices de desflorestamento na região por conta da chegada do tempo seco.

“O cenário de seca na Amazônia facilita toda a logística de derrubada da floresta, porque há melhor condição para movimentar o furto de madeira. É quando o garimpo ilegal, por exemplo, consegue chegar por terra em uma área protegida com mais facilidade e menos custos. É quando também se consegue tocar fogo na floresta, com a grilagem acelerando a sua prática de ilegalidades”, explica Astrini, que critica ainda o desmonte dos órgãos de fiscalização.

“Esse é o período em que, naturalmente, um governo decente se prepara para encarar. Não é o que a gente tem nesse governo, que se junta à farra do crime ambiental e deixa a ilegalidade correr solta. Bolsonaro sistematicamente sabotou a capacidade do estado brasileiro de enfrentar o crime ambiental na Amazônia. Desidratou o Ibama e o ICMBio e retirou as operações de campo, danificando a capacidade de combate à devastação, que cresceu exatamente nessa situação”, afirma Astrini.

Alertas de área desmatada em julho de 2022

Pará: 506 km²
Amazonas: 492 km²
Mato Grosso: 217 km²
Rondônia: 170 km²
Acre: 78 km²
Maranhão: 19,5 km²
Roraima: 3,83 km²
Amapá: 0,53 km²
Tocantins: 0,50 km²

Fonte: Deter/Inpe

Amazonas segue líder no acumulado do ano

Nos sete primeiros meses deste ano, quase 5.500 km² foram desmatados na Amazônia, um recorde da série histórica do Deter para o período. Em 2021, nesse mesmo período, a área com alertas foi de 5.102 km². Até o momento, o Amazonas aparece, pela primeira vez, como o estado mais desmatado do ano, ultrapassando o Pará, que tradicionalmente era o líder entre os rankings.

Dos 10 municípios mais desmatados em julho de 2022, quatro são amazonenses, com destaque para Apuí e Lábrea, no sul do estado, que encabeçam a lista. As duas cidades também aparecem em primeiro e segundo lugar, respectivamente, no acumulado do ano, o que ajudou a puxar seu estado para o topo do ranking.

Mapa do Monitor PlenaMata mostra alertas de desmatamento do Deter no último ano. No mapa, clique sobre o menu de camadas para ver também as taxas anuais de desmatamento na Amazônia Legal e utilize o controle de navegação no canto superior esquerdo para aproximar ou afastar das áreas desmatadas.

De acordo com o ex-diretor do Inpe Gilberto Câmara, que implantou o sistema Deter no órgão, as florestas sul-amazonenses vêm sofrendo pressões diante da perspectiva de expansão da fronteira agrícola na região conhecida como Amacro, que compreende o sul do Amazonas, leste do Acre e noroeste de Rondônia.

Autointitulada Zona de Desenvolvimento Sustentável, a Amacro é um projeto de polo de agronegócio em áreas que vêm se tornando nos últimos anos o novo vetor de desmatamento na Amazônia, tendo concentrado 20,8% das derrubadas no bioma amazônico em 2021, segundo relatório do MapBiomas.

“Eram áreas que até alguns anos atrás estavam mais preservadas e que hoje são objeto de especulação, com muita gente envolvida no sistema de grilagem. O cara que desmata ali quase nunca é um produtor, mas sim um grileiro que tem um esquema, que vende a madeira. Eles estão se antecipando também ao crescimento do mercado naquela região da Amacro”, esclarece Câmara.

Eram áreas que até alguns anos atrás estavam mais preservadas e que hoje são objeto de especulação, com muita gente envolvida no sistema de grilagem.

Gilberto Câmara, ex-diretor do Inpe

Astrini, do Observatório do Clima, também credita o aumento do desmatamento nos municípios do sul do Amazonas à expectativa das obras da BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO). O trecho cortaria alguns dos blocos mais preservados da floresta amazônica, onde estão situadas Terras Indígenas e Unidades de Conservação.

“O simples anúncio dessa estrada já gera uma corrida de grileiros e de disputa pela posse da terra. Então, a BR-319 tem sido um forte poder indutor desse aumento do desmatamento no Amazonas, um estado que tinha números muito baixos de devastação. Essa é uma tragédia anunciada e esfregada na cara de todas as autoridades brasileiras e que se consuma neste governo”, diz Astrini.

Seguindo o recorte fundiário, quase 30% do desmatamento na Amazônia em julho deste ano se deu em áreas registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR), instrumento eletrônico autodeclaratório para regularização de imóveis rurais. Já as Florestas públicas não destinadas, tanto as de domínio federal quanto estaduais, foram responsáveis por mais de 21% da devastação nesse período. 

Novo recorde

A chegada do verão Amazônico aliada ao desmonte da fiscalização, na visão de Astrini e Câmara, projetam um segundo semestre preocupante para a Amazônia, seguindo a tendência dos meses anteriores.

O ex-diretor do Inpe, por sua vez, reforça que o Deter é o termômetro do desmatamento e que tem indícios, com base nos números recentes, de que as derrubadas na Amazônia entre agosto de 2021 e julho de 2022, período em que o Inpe considera como ano de análise, serão maiores do que os 12 meses anteriores.

“O Deter está dizendo para a gente que a coisa está péssima e que nós estamos caminhando para o maior nível de desmatamento dos últimos 16 anos. Muito mais floresta está sendo derrubada e a Amazônia não fica mais rica como resultado disso. Não houve salto de crescimento por conta de todo esse desmatamento. A não ser no bolso de uns e de outros…”, afirma Câmara.


Reportagem do InfoAmazonia para o projeto PlenaMata.

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