As quatro espécies que habitam a região ainda são um mistério. Não há estimativas confiáveis da quantidade de botos existentes e pouco se sabe de seu comportamento

Por Gustavo Faleiros, de Tefé (AM)

Os botos são alguns dos animais mais icônicos da Amazônia. Tanto o Tucuxi (Sotalia fluviatilis) – a espécie de coloração cinzenta – quanto aquela conhecida como boto cor-de-rosa (Inia geoffrensis), há muito fazem parte da cultura dos povos indígenas e dos ribeirinhos. Os índios Kokama, por exemplo, têm uma ampla coleção de contos e fábulas onde o homem-boto pinta e borda nos vilarejos à beira dos rios.

Ainda que importantes na cultura amazônica, as quatro diferentes espécies que habitam a região são um verdadeiro mistério. Não existem estimativas confiáveis da quantidade de botos existentes e não se sabe muito de seu comportamento. Na lista vermelha da União Mundial para Conservação da Natureza – referência na avaliação das ameaças a biodiversidade – os botos aparecem como grupo com dados insuficientes.

Desde o ano passado, pesquisadores estão empregando uma nova tecnologia para mudar o quadro de falta de informação: aeronaves não tripuladas. A investigação, uma parceria entre o Instituto Mamirauá e a organização não governamental WWF, utiliza os drones na contagem de botos nas calhas do rios da Amazônia brasileira. A iniciativa faz parte do projeto Ecodrones, que já vem aplicando a metodologia em outras partes do planeta, mas pela primeira o fez no monitoramento de vida silvestre na floresta tropical.

Uma primeira expedição realizada em novembro de 2016 captou a imagem de 791 botos através de 54 filmagens de dez minutos realizadas a 20 metros de altura no Rio Juruá, no oeste do estado do Amazonas. O esforço de captação de vídeos ocorreu ao longo de uma viagem de 9 dias de 400 km neste grande afluente da bacia amazônica.

Veja abaixo vídeo da expedição Ecodrones – Botos da Amazônia

Daqui duas semanas, entre os dias 15 e 20 de junho, uma nova expedição será realizada no Rio Juruá. A ideia é confirmar a capacidade do drone de realizar pelo menos 50% do trabalho que hoje é feito por pesquisadores embarcados. Nos primeiros testes, o drone percorreu apenas uma faixa de 100 metros marginal ao barco de pesquisa, enquanto os cientistas dividem-se em três, cada um de um lado e outro e à frente, para anotarem os avistamentos de botos.

O avistamento de botos é feito por pesquisadores na proa do navio Foto: Amanda Lelis/Inst. Mamirauá

“O resultado até agora é muito bom considerando que, com apenas 100 metros e voos de 10 minutos, foi possível obter 50% dos avistamentos pelos pesquisadores, que enxergam até 300 metros”, explica o Marcelo Oliveira, coordenador do projeto pelo WWF. “O próximo teste é tentar equiparar estes avistamentos e, para isso, teremos que buscar equipamentos com câmeras melhores e maior autonomia”, diz.

Os pesquisadores estão utilizando os modelos Phanton 3 e 4, considerados acessíveis e fáceis de pilotar. O custo de uma aeronave como esta é de aproximadamente 12 mil reais, enquanto alguns drones de maior porte chegam a 200 mil reais.

A bióloga do programa de Mamíferos Aquáticos do Instituto Mamirauá Daiane Rosa pondera que uma dos principais vantagens na utilização dos drones será a eventual redução dos custos nas expedições: “Estamos tentando desenvolver um método específico para a contagem com o drone, que não envolveria pessoas, ou envolveria bem menos”.

Atualmente, a bióloga relata, uma expedição como a feita no Rio Juruá envolve 20 pessoas no barco. O plano para o futuro seria tentar fazer expedição com apenas duas pessoas em uma voadeira equipada com baterias solares para a recarga dos drones. Além disso, os sobrevoos poderiam ter rotas automatizadas e autonomia de 40 minutos.

Os pesquisadores Daiane da Rosa (Inst. Mamirauá) e Marcelo Oliveira (WWF) Foto: Amanda Lelis (Inst. Mamirauá)

A automatização das análises também podem ser um passo importante para melhorar as estimativas populacionais. Todos os 54 vídeos gerados foram assistidos por quatro pessoas para realizar a contagem. Este esforço foi relatado à empresa Conservation Drones, que está desenvolvendo um algoritmo que permitiria o cálculo dos botos em cada filmagem aérea.

A esperança de Marcelo Oliveira, da WWF, é que o uso de inteligência artificial no estudo das espécies de botos da Amazônia possa finalmente suprir os dados hoje insuficientes: “Vamos tentar chegar ao número completo da população”, afirma.

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