Densas vegetações no Amazonas e Amapá, que possuem mais da metade de seus territórios formados por unidades de conservação e terras indígenas, conseguiram remover todos os lançamentos de CO2 equivalente em suas atmosferas em 2021, revela estudo do Observatório do Clima.

Estado com maior área preservada do Brasil, com 91% de cobertura florestal, o Amazonas tem mais da metade de seu extenso território formado por unidades de conservação e terras indígenas. Essas áreas ajudam a proteger cerca de 800 mil km² de florestas que prestam diversos serviços ambientais ao planeta, sendo um deles a remoção de gases do efeito estufa da atmosfera.

Essa absorção acontece durante o processo de fotossíntese das plantas, que precisam de uma grande quantidade de carbono para crescerem e sobreviverem. Assim, elas capturam o CO2 presente na atmosfera e devolvem apenas o oxigênio.

Em 2021, as densas vegetações de áreas protegidas no Amazonas capturaram quase 150 milhões de toneladas de carbono equivalente (CO2e): Medida internacionalmente padronizada de quantidade de gases de efeito estufa (GEE) que converte todos eles em uma única unidade, o dióxido de carbono, responsável pelo aquecimento global. O número é superior às emissões brutas no estado naquele ano, ou seja, na unidade federativa, houve balanço negativo de lançamentos. O termo “equivalente” significa que outros gases do efeito estufa, como o metano e o óxido nitroso, por exemplo, também entraram na conta, porém foram convertidos para uma única unidade, o dióxido de carbono.

Nos nove estados da Amazônia Legal, as unidades de conservação: É um território voltado à manutenção de ecossistemas e de recursos naturais para toda a sociedade e com delimitação, gestão e proteção do poder público. e as terras indígenas: Territórios da União reconhecidos e delimitados pelo poder público federal para a manutenção do modo de vida e da cultura indígenas em todo o país. removeram 27% (354,4 milhões de toneladas) do CO2e bruto emitido na região em 2021. De todo o volume de remoções na Amazônia, 64% se deu em áreas protegidas: Regiões tuteladas pela legislação ambiental em terra, águas doces e marinhas..

É o que diz a 10ª edição do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), estudo lançado pelo Observatório do Clima em parceria com Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e Governos Locais para a Sustentabilidade (Iclei).

Para a pesquisadora no Ipam Bárbara Zimbres, as áreas protegidas na Amazônia, em especial as terras indígenas, têm papel fundamental na luta contra o aquecimento global. "A função delas é muito mais que contribuir para a remoção do carbono da atmosfera. É, principalmente, a de frear o desmatamento, o maior fator de geração de emissões no país".

A função delas é muito mais que contribuir para a remoção do carbono da atmosfera. É, principalmente, a de frear o desmatamento, o maior fator de geração de emissões no país.

Bárbara Zimbres, pesquisadora do IPAM

Embora as áreas protegidas tenham conseguido frear boa parte das emissões geradas na Amazônia, as liberações dos gases do efeito estufa na região tiveram saldo líquido de 739,9 milhões de toneladas de CO2e. Isso significa que a região amazônica mais emitiu que sequestrou o dióxido de carbono equivalente. No entanto, nem sempre isso foi assim.

Bárbara explica que entre 2010 e 2012 as florestas conseguiram absorver quase a totalidade das emissões. "Isso aconteceu após todo o esforço de uma década para a diminuição do desmatamento. Porém, nos últimos anos, a gente tem visto um aumento da devastação e, com isso, as emissões começam a predominar novamente, especialmente a partir de 2017".

Ela alerta ainda para um fenômeno grave na região: a perda gradativa da absorção dos gases pela vegetação. "Até mesmo as florestas intactas têm perdido seu potencial de remoção por conta das mudanças climáticas. Os anos estão mais secos e isso prejudica o processo".

Até mesmo as florestas intactas têm perdido seu potencial de remoção por conta das mudanças climáticas. Os anos estão mais secos e isso prejudica o processo.

Bárbara Zimbres, pesquisadora do IPAM

De acordo com o SEEG, 76,6% do CO2 equivalente lançados na Amazônia no ano passado vieram das derrubadas florestais. "A Amazônia é responsável por mais da metade das emissões nacionais. E isso se dá por conta do desmatamento. Se a gente não controlar a devastação na região, não fará diferença atingir as metas de redução de outras fontes de lançamentos de gases, como energia, transportes e indústrias, por exemplo", avalia Bárbara.

Já as atividades agropecuárias, em especial a criação de bovinos, responderam por 21,7% das emissões brutas dos gases do efeito estufa na Amazônia em 2021. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o rebanho na região bateu recorde no ano passado, com quase 97 milhões de cabeças de gado. Quatro estados da Amazônia Legal aparecem entre os 10 maiores criadores no país: Mato Grosso, Pará, Rondônia e Tocantins.

Ranking tamanho do rebanho

Veja no mapa acima dados por cidades. Abaixo, conheça a posição dos estados da Amazônia Legal em relação ao Brasil:

1º - Mato Grosso: 32.424.958 cabeças de gado
3º - Pará: 23.921.005
6º - Rondônia: 15.110.301
10º - Tocantins: 10.161.938
11º - Maranhão: 8.561.509
14º - Acre: 4.047.283
19º - Amazonas: 1.496.165
25º - Roraima: 937.989
27º - Amapá: 52.768

Fonte: IBGE 2021

Causa e efeito

A relação entre desmatamento, agropecuária, emissões de CO2 equivalente e o papel das áreas protegidas em mitigar esses lançamentos fica evidente ao tomar o Pará como exemplo.

O estado foi o que mais desmatou na Amazônia em 2021, com 5.234 km² desflorestados, segundo o Prodes: Projeto para o mapeamento oficial das perdas anuais de vegetação nativa na Amazônia Legal., do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe). Além disso, o Pará concentrou naquele ano 24 milhões de cabeças de gado e representa o segundo maior rebanho bovino da região, atrás apenas do Mato Grosso. 

O resultado foi a maior liberação de gás carbônico do país: foram 448 milhões de toneladas emitidas pelo Pará. Desse total, 85% foram gerados pelo desmatamento e 11% pela agropecuária, segundo o SEEG. No entanto, quase 40% das emissões foram removidas no estado pela vegetação, sendo que 65% dessas remoções se deram em áreas protegidas, que cobrem metade do território paraense.

Com 71% de seu território formado por áreas protegidas e apenas 4% de suas florestas desmatadas, o Amapá é o exemplo oposto. Em 2021, foi o estado da Amazônia Legal que menos desmatou a Amazônia, perdendo apenas 17 km² de florestas. Já no ranking de rebanho bovino, os amapaenses ocupam a última posição nacional, com 52,7 mil cabeças de gado registradas no ano.

Com isso, a unidade federativa não só teve a menor emissão bruta de CO2e do país, 4,5 milhões de toneladas, como também conseguiu absorver quase quatro vezes esse volume, sendo o único estado brasileiro a repetir o feito do Amazonas (sequestrar mais que emitir).

No lançamento do SEEG 10, o secretário-executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini, alertou para as consequências das emissões descontroladas dos gases responsáveis pelo aquecimento global. “Temos vários eventos climáticos extremos acontecendo no Brasil que impactam o dia a dia das pessoas, como secas, alagamentos e deslizamentos. E é a população pobre que mais sente esses efeitos”, afirmou.

Temos vários eventos climáticos extremos acontecendo no Brasil que impactam o dia a dia das pessoas, como secas, alagamentos e deslizamentos. E é a população pobre que mais sente esses efeitos.

Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima

Ele destaca ainda que em 2021 as emissões no país tiveram a maior alta em quase duas décadas e atribui esse recorde ao presidente Jair Bolsonaro (PL). “Temos um governo que se revelou uma verdadeira máquina de jogar carbono para a atmosfera, que negou a agenda de clima e fez tudo o que podia para destruir a governança ambiental do nosso país, especialmente na Amazônia, que é o nosso maior foco de emissões”.


Reportagem do InfoAmazonia para o projeto PlenaMata.

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