Documento final assinado pelos líderes do G20, no Rio, repercutiu no Azerbaijão, na COP29, durante as negociações climáticas. Por lá, a discussão é como garantir o financiamento para reduzir os problemas causados pelo aquecimento do planeta.
A cúpula do G20 foi oficialmente concluída na tarde desta terça-feira (19), no Rio de Janeiro (RJ), após a assinatura de uma declaração final por todos os países do grupo. Nela, os líderes se comprometeram a tributar os bilionários, enfrentar a desigualdade e agir a favor do clima.
“Estamos decididos a liderar ações ousadas, oportunas e estruturais em nossas economias nacionais e no sistema financeiro internacional com o objetivo de acelerar e ampliar a ação climática, em sinergia com as prioridades de desenvolvimento sustentável e os esforços para erradicar a pobreza e a fome”, afirma trecho do documento.
A declaração foi divulgada no final da tarde desta segunda-feira (18) e repercutiu do outro lado do oceano, em Baku, no Azerbaijão, onde, desde 11 de novembro, ocorre a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29).
“A reunião do G20 não é o lugar que salvará o mundo. Existem espaços multilaterais onde são tomadas decisões com força legal, como a COP”, esclareceu Enrique Maurtua Konstantinidis, consultor sênior de política climática na Global Gas and Oil Network, uma rede europeia de organizações da sociedade civil que apoia os esforços para deter a expansão do petróleo e gás. “Os comunicados do G20 importam pelo que o grupo representa”, completou.
Os países do G20 são, juntos, responsáveis por 75% das emissões globais de gases de efeito estufa. “Todos os países devem fazer sua parte. Mas o G20 deve tomar a iniciativa”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, no início da COP29, argumentando: “são os maiores emissores, com maiores capacidades e responsabilidades. Devem unir seus conhecimentos tecnológicos, e os países desenvolvidos devem apoiar as economias emergentes”.
Na declaração, os líderes do G20 se comprometem a acelerar a reforma da arquitetura financeira internacional para ajudar os países em desenvolvimento a lidar com as mudanças climáticas e a erradicação da pobreza. “Para o financiamento, o texto é algo positivo. Mas aqui na COP é onde os países precisam tomar decisões”, afirmou Luca Bergamaschi, co-diretor da ECCO, uma organização da Itália que discute soluções sobre mudanças climáticas.
Sobre as ações relacionadas às mudanças climáticas, em Baku, os países discutem e negociam um tema fundamental para sua implementação: a Nova Meta Quantificada Coletiva (NCQG, na sigla em inglês). O objetivo é definir os detalhes sobre como ocorrerá a mobilização de recursos financeiros dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento, a partir de 2025, para que estes possam implementar suas políticas climáticas. Quanto dinheiro será mobilizado, quem deverá fornecê-lo, quem será beneficiado, em que formato e sob qual marco de transparência são alguns dos elementos em disputa entre os dois grupos de países.
Na declaração, os líderes do G20 se referem brevemente ao tema: “Esperamos que em Baku se alcance um resultado satisfatório da NCQG. Estamos comprometidos a apoiar a Presidência da COP29 e a realizar negociações bem-sucedidas”. O secretário-executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, Simon Stiell, compartilhou sua interpretação: “os líderes do G20 enviaram uma mensagem clara aos seus negociadores na COP29: não saiam de Baku sem uma nova meta de financiamento bem-sucedida. Isso é claramente do interesse de todos os países”.
Da declaração, é possível identificar indiretamente dois dos elementos mais controversos sobre a NCQG. Por um lado: quanto dinheiro essa nova meta deve mobilizar? Deve ter um piso de 100 bilhões de dólares anuais ou prover ao menos 1 trilhão, 1,1 trilhão, 1,3 trilhões ou 2 trilhões? Essas são algumas das opções em discussão na COP29.
Os países em desenvolvimento e a sociedade civil defendem um salto quantitativo de bilhões para trilhões — 100 bilhões de dólares anuais foi a meta anterior. O Grupo Independente de Peritos de Alto Nível sobre Financiamento Climático (International High-Level Expert Group on Climate Finance, IHLEG, na sigla em inglês) relatou na semana passada que os países desenvolvidos precisam de cerca de 1 trilhão de dólares anuais até 2030 para lidar com as mudanças climáticas.
Embora não se refira diretamente à NCQG, mas ao financiamento climático de forma geral, a declaração exige esse salto nos investimentos, com um detalhe: que os recursos sejam provenientes de todas as fontes. Ou seja, não apenas de fundos públicos, mas também de investimentos privados, de fundos multilaterais e de países, independentemente de sua categoria.
Isso se relaciona com um outro elemento crítico na discussão: quem deve fornecer esse dinheiro. Nas negociações, os países desenvolvidos argumentam não ter fundos públicos suficientes para uma meta de trilhões e pedem a inclusão de países não desenvolvidos que possam estar em condições de ajudar outros (como a China) e de um setor privado mais ativo. Os países em desenvolvimento se baseiam no Acordo de Paris para afirmar que a responsabilidade deve ser dos países desenvolvidos.
Na declaração, os líderes do G20 se referem tanto a fontes públicas quanto privadas ao enfatizar a necessidade de maior colaboração e apoio internacional para aumentar o financiamento e o investimento em ação climática nos países em desenvolvimento.
“Os países desenvolvidos continuam impassíveis e não conseguem quantificar os trilhões de dólares necessários, nem garantir que esses fundos sejam entregues na forma de subsídios, algo essencial para alcançar a justiça climática”, disse Harjeet Singh, diretor de engajamento Global da Fossil Fuel Non-Proliferation Treaty Initiative, organização que busca eliminar gradualmente os combustíveis fósseis.
“Se não houver avanços decisivos em financiamento na COP29, estaremos caminhando para um cenário catastrófico de temperaturas, no qual os mais vulneráveis sofrerão as piores consequências”, acrescentou.
A COP29 deve ser concluída nesta sexta-feira (22). As diferenças entre os países indicam que a conferência pode se estender. Com a chegada dos ministros do meio ambiente, as discussões técnicas foram elevadas ao nível político, na necessidade de reduzir as diferenças e alcançar os consensos necessários. “A COP é o lugar onde a política climática é decidida, não o G20”, disse Shreeshan Venkatesh, líder de política global na Climate Action Network International, rede composta por mais de 1.900 organizações não governamentais de mais de 130 países.