Anúncio foi feito por Marcos Kaingang, secretário de Mediação e Conflitos do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), durante o Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília. Medida é tomada após associação Yanomami anunciar que indígenas precisaram render invasores nesta semana e levar até a Força Nacional dentro do território.
O governo federal pretende instalar uma base permanente na Terra Indígena (TI) Yanomami para concluir a retirada de garimpeiros ilegais que insistem em permanecer na região. O anúncio foi feito por Marcos Kaingang, secretário de Mediação e Conflitos do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), durante um debate sobre mineração e garimpo em terras indígenas realizado no Acampamento Terra Livre (ATL) nesta quinta-feira (25), em Brasília.
A plenária contou com representantes das terras indígenas Yanomami, Munduruku, Kayapó e Mura, todas afetadas por projetos de mineração industrial e garimpo ilegal, e que também receberam sinalização de apoio do MPI. Segundo Kaingang, a estratégia do governo federal durante a operação de janeiro de 2023 no território Yanomami reduziu a presença dos exploradores em até 70%, mas, após a retirada dos garimpeiros e a destruição de máquinas e equipamentos, muitos criminosos voltaram.
“Nesta nova fase, que será implantada até o final do ano, nós vamos instalar bases fixas para realizar ações permanentes e garantir que os garimpeiros não voltem”, afirmou o secretário de Mediação e Conflitos do do MPI durante a plenária do ATL.
Durante o evento, Dário Kopenawa, liderança da TI Yanomami, relatou que a situação na terra indígena melhorou após o início das operações do governo federal, principalmente com o recebimento de ajuda humanitária e tratamentos de saúde, porém afirmou que “os garimpeiros continuam”.
“Nós não sabemos quantos são, mas são muitos. Ainda existe muito movimento de garimpeiros nos rios e nas pistas de pouso”, explicou Kopenawa. Segundo informações do MPI, dos 20 mil garimpeiros que estavam na região no começo do governo, cerca de 6 mil permanecem fazendo a garimpagem de ouro na terra Yanomami.
O anúncio da instalação da base permanente no território ocorreu após a Urihi Associação Yanomami, entidade fundada em 2016 com base nas regiões das serras que abrangem a comunidade Surucucu e as áreas vizinhas, divulgar uma nota informando que os próprios indígenas do território precisaram escoltar os invasores até a Força Nacional. A organização afirmou que os Yanomami “estavam presenciando o seu único meio de consumir água ser contaminado por mercúrio, em razão da presença dos garimpeiros na localidade”.
“A morosidade da expulsão de garimpeiros nas regiões mais isoladas do território tem sujeitado suas comunidades à violência de criminosos, com especial impacto sobre os seus meios de sustentabilidade”, diz um outro trecho da nota.
Governo pede mais um ano para desintrusão de terras indígenas
No mesmo evento no ATL, o cacique Juarez Saw Munduruku fez um apelo de socorro ao MPI para retirada dos garimpeiros do território. Ele lembrou que a população da TI Munduruku, no Pará, está diagnosticada com alto teor de mercúrio no corpo e pediu ações mais contundentes para que os indígenas não sejam aliciados pelos garimpeiros: “nós estamos perdendo nossos parentes para essa doença, o mercúrio está contaminando as mulheres grávidas e as crianças”.
O secretário do MPI afirmou que a TI Munduruku também passará por processo de desintrusão semelhante ao que está sendo planejado para a TI Yanomami: “nessas regiões onde os garimpeiros voltam após as operações, nós avaliamos que o melhor modelo é esse, de manter bases permanentes”, disse Marcos Kaingang.
O Supremo Tribunal Federal (STF) exige que a desintrusão das terras indígenas seja cumprida pelo governo federal até o final de 2024. A decisão do ministro Luís Roberto Barroso determina a retirada de invasores de sete territórios: além das terras Yanomami e Munduruku, a determinação prevê os territórios Kayapó, Uru-Eu-Wau-Wau, Karipuna, Trincheira Bacajá e Araribóia.
Marcos Kaingang antecipou que o governo pediu mais tempo ao STF para cumprir a decisão, com alargamento de pelo menos mais um ano de prazo. Além disso, o MPI também incluiu mais dois territórios nos processos de desintrusão, Alto Rio Guamá e Apyterewa, as duas já desocupadas pelo governo federal.
“A verdade é que não é possível fazer a desintrusão de uma terra indígena em um mês como o STF imaginou. É preciso planejamento e estratégia, o que leva tempo. Um exemplo é a Yanomami, onde mais de um ano depois ainda não conseguimos tirar todos os garimpeiros do território”, declarou o secretário do MPI.
MPI diz que projeto de potássio em terra indígena é ilegal
Também presente na reunião, o tuxaua da aldeia Lago do Soares, no Amazonas, Felipe Gabriel Mura, levou depoimentos dos indígenas do território Mura que são contra o projeto para exploração de potássio na região, recentemente aprovado pelo governo do estado.
O território Mura, onde está a aldeia Lago do Soares, está em processo de demarcação e, segundo Gabriel, lideranças locais foram aliciadas pela empresa Potássio do Brasil para aceitarem o projeto: “eles tentam criar a narrativa de que não têm indígenas lá, que não é terra indígena, mas, ali, naquele território, é onde nós e nossos antepassados vivemos desde sempre. O projeto de mineração não vai só tirar nossos territórios de nós, ele vai tirar nossas vidas”.
Kaingang informou que o MPI vê problemas no processo e que o caso está judicializado. “Nós entendemos que a consulta aos povos indígenas não pode ser conduzida pela mesma empresa que está interessada no projeto”, afirmou. O Ministério Público Federal (MPF) também considerou o licenciamento da obra irregular, apontando violação dos direitos dos povos indígenas da região, e, desde 2016, move uma ação judicial que questiona a liberação do licenciamento pelo órgão ambiental do estado.
A InfoAmazonia acompanha o caso desde 2021 e apurou suspeitas de ilegalidades da Potássio do Brasil. Em 2020, a empresa omitiu informações a investidores internacionais, quando assinou contrato para construção da mina com uma companhia chinesa, mesmo com decisão, na época, suspendendo o projeto. No ano passado, a mineradora foi denunciada na SEC, órgão dos Estados Unidos equivalente à Comissão de Valores Mobiliários, por omitir informações dos seus investidores sobre a questão indígena envolvendo o projeto de potássio na bacia do Rio Madeira, no território Mura.