O mês bateu recorde em 2022: 1.455 km² de florestas foram ao chão na Amazônia Legal em setembro, de acordo com o Inpe.

O desmatamento na Amazônia segue batendo recorde em pleno período eleitoral. Em setembro, enquanto os candidatos faziam suas campanhas, 1.455 km² de florestas foram ao chão na região – o número é 48% maior que o registrado no mesmo período do ano passado e é a pior taxa da série histórica para o mês. O recorde foi registrado pelo Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia em Tempo Real (Deter: O Deter é o programa do Inpe que auxilia o trabalho do Ibama e outros órgãos de fiscalização ambiental com a emissão de alertas de desmatamento. A ferramenta foi lançada em 2004, mas teve uma importante atualização em 2015, quando passou a se chamar Deter-B.), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). 

As queimadas na Amazônia Legal também dispararam no mês passado, com 48,5 mil focos detectados pelo satélite de referência monitorado pelo Inpe, mais que o dobro do registrado em setembro de 2021 (22,6 mil).

Entre os 10 municípios mais desmatados na Amazônia no mês, nove estão na área que compreende a fronteira agrícola da região, também conhecida como arco do desmatamento, que começa no oeste do Maranhão e vai até o leste do Acre. Uma dessas cidades é Novo Progresso, no extremo sudoeste do Pará, onde Bolsonaro obteve a maior votação proporcional (79,60% dos votos) na Amazônia no primeiro turno das eleições de 2022.

A cidade, nascida nas margens da BR-163, que liga o Pará ao Rio Grande do Sul, perdeu 1.067 km² de floresta nos três primeiros anos do atual governo (2019 a 2021), segundo o MapBiomas. Quase a totalidade dessa área foi convertida para a agropecuária, uma das principais atividades econômicas do município, ao lado da indústria madeireira.

Novo Progresso ficou famoso por ter sido o epicentro, em agosto de 2019, do chamado “Dia do Fogo”, quando fazendeiros realizaram uma série de queimadas de forma coordenada. As chamas invadiram áreas protegidas na região, entre elas a Floresta Nacional de Jamanxim, uma das que mais sofre pressão na Amazônia. Neste ano, o município segue queimando, com mais de 3 mil focos de fogo, 57% a mais que o registrado em todo o ano de 2019. 

Para Beto Mesquita, doutor em Ciências Ambientais e Florestais e membro da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, existe uma clara relação entre desmatamento, crime ambiental e a vitória expressiva de Bolsonaro não só em Novo Progresso, mas também nas demais cidades do arco do desmatamento que deram grande votação ao candidato.

“Os dados das eleições nesses locais são resultado direto dessa política de governo que reduziu a capacidade de atuação dos órgãos de fiscalização e estimulou a grilagem: Ocupação ilegal de terras públicas por meio da falsificação de documentos., a invasão de áreas protegidas: Regiões tuteladas pela legislação ambiental em terra, águas doces e marinhas. e a destruição dos recursos naturais. Isso conta com o respaldo de mandatários locais apoiados por grileiros e desmatadores e se junta ao controle da política pelo medo e pela desinformação”, afirma Mesquita.

Os dados das eleições nesses locais são resultado direto dessa política de governo que reduziu a capacidade de atuação dos órgãos de fiscalização e estimulou a grilagem, a invasão de áreas protegidas e a destruição dos recursos naturais.

Beto Mesquita, doutor em Ciências Ambientais e Florestais e membro da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura

Ele ressalta o perigo de se opor ao atual governo em localidades da Amazônia onde o crime ambiental impera. “As ameaças estão por todo lado. O aumento do assassinato de lideranças indígenas e de movimentos sociais é presente. Em um cenário como esse, não é surpreendente que a gente tenha uma população acuada”, alerta.

“Paralelo a isso, temos o papel da desinformação e do discurso único, que não permite a entrada do contraditório nesses territórios. Eu não acredito que todas essas pessoas estão realmente cientes do que está sendo feito e apoiam esse modelo de que é desmatando que se tem prosperidade, porque quando a gente olha para quem está sendo efetivamente beneficiado, percebe que não é a sociedade como um todo, mas sim os poucos de sempre”.

A história de Novo Progresso está ligada à rodovia que corta o Brasil de Norte a Sul, rasgando a Amazônia nos estados do Pará e Mato Grosso. Em 1983, dez anos após o início da construção da BR-163, já havia um pequeno povoado onde hoje fica a cidade, emancipada em 1991.

A estrada é um dos maiores corredores produtivos do país, interligando seis estados, o que explica a pressão agrícola sobre seu entorno na região amazônica, no coração do arco do desmatamento. “Boa parte dessa movimentação é especulativa e vai resultar mais à frente na expansão, por exemplo, da fronteira de produção de grãos”, alerta Mesquita.

“Entre 2005 e 2012, quando fomos capazes de reduzir em 83% as derrubadas na Amazônia, as regiões do arco do desmatamento registraram as maiores diminuições, porque eram as áreas estratégicas a serem atacadas. Hoje, nós observamos um recrudescimento das taxas porque as políticas de combate à devastação foram deixadas para trás pelo atual governo”, continua.

Mesquita explica ainda que as áreas protegidas da região são hoje as maiores responsáveis por conter o avanço da fronteira agrícola pela floresta. “O arco do desmatamento só é um arco, e não linhas retas comendo a Amazônia de baixo para cima, porque do outro lado nós temos unidades de conservação e terras indígenas que servem como barreira para essa expansão”.

Dados da Amazônia

Só em 2022, mais de 8.500 km² já foram desflorestados na região, sendo o maior valor registrado pelo Deter nos nove primeiros meses. O acumulado já supera o total desmatado durante todo o ano de 2021.

Desmatamento em setembro

Pará: 531 km²
Mato Grosso: 340 km²
Amazonas: 284 km²
Rondônia: 154 km²
Acre: 121 km²
Maranhão: 12 km²
Roraima: 9 km²
Amapá: 2 km²
Tocantins: 2 km²

Fonte: Deter/Inpe

O Observatório do Clima (OC) alerta para a possibilidade de 2022 igualar ou superar 2019 (9.178 km²), o pior ano da série histórica. A organização credita a elevação sucessiva dos índices à política ambiental do presidente Jair Bolsonaro (PL). Segundo ela, o candidato à reeleição, ao longo de seu mandato, estimulou invasões de garimpeiros às terras públicas, se recusou a usar verbas internacionais para combater as derrubadas e deixou o crime organizado dominar a região.

“Os dados de devastação nos dão 1.455 motivos para tirar Jair Messias Bolsonaro da presidência da República no próximo dia 30”, informou o OC em comunicado, em referência ao total desmatado em setembro.

“Irresponsável, inepto, paranoico e cruel, Bolsonaro destruiu a política ambiental e climática brasileira, o que isolou o país do mundo, impediu acordos comerciais e bloqueou investimentos. Colheu, como resultado de tudo isso, o primeiro ciclo de três altas seguidas nas taxas de desmatamento medidas pelo Inpe em um mesmo mandato presidencial – e pode estar a caminho de uma quarta”, complementa a organização.

Irresponsável, inepto, paranoico e cruel, Bolsonaro destruiu a política ambiental e climática brasileira, o que isolou o país do mundo, impediu acordos comerciais e bloqueou investimentos.

Observatório do Clima (OC)

Os 1.455 km² devastados em setembro, se convertidos em gás carbônico, representam a emissão de 70 milhões de toneladas do poluente responsável pelo aquecimento global, segundo o Observatório do Clima. Essa é a quantidade que a Áustria libera em um ano.

Para o secretário-executivo do OC, Márcio Astrini, se o mundo quiser ter chance de resolver a crise climática, precisa reduzir as emissões perto da metade daqui a sete anos.


Reportagem do InfoAmazonia para o projeto PlenaMata.

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