O Ministério Público Federal realizou uma audiência pública em Santarém para discutir impactos da construção da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós e as irregularidades do estudo de impacto ambiental.
O Ministério Público Federal (MPF) realizou uma audiência pública na tarde de ontem (29) em Santarém (PA) para discutir impactos da construção da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós e as irregularidades do estudo de impacto ambiental. Especialistas e lideranças das comunidades atingidas participaram da mesa. Confira a seguir alguns trechos das falas dos participantes.
“Consulta póstuma”
Sobre o direito dos povos tradicionais à consulta prévia, Rodrigo Oliveira, assessor jurídico do MPF e pesquisador da UFPA afirmou: “O governo está argumentando que esses grupos não querem ser consultados. O risco é que se tenha uma ‘consulta póstuma’, que o processo se resuma a negociar danos.”
“Não são só os Munduruku, todo mundo vai sofrer e todos tem o direito de lutar junto”, afirmou Arnaldo Kabá, cacique-geral do povo Munduruku no Pará.
“Eles são desrespeitosos, chegam na nossa comunidade de uma forma ou de outra fazendo os estudos. Nós vamos unir forças para barrar esse empreendimento. Somos defensores da natureza, daquilo que o papai do céu deixou para nós, que é sagrado”, afirmou CAK, liderança da comunidade Pimental e integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Impactos na economia e na saúde dos atingidos
De acordo com o médico neurologista Erik Jennings, as hidrelétricas que estão planejadas para essa região tem o potencial de aumentar o metil-mercúrio (tóxico) nos peixes para níveis superiores ao seguro para a saúde humana, causando graves problemas neurológicos principalmente para crianças.
A pesquisadora Camila Jericó-Daminello destacou os prejuízos econômicos para os atingidos causados pelos impactos nos “recursos ecossistêmicos” fundamentais para a subsistência. Segundo ela, essas perdas não são consideradas no EIA. “Em um ano uma família perderia o equivalente a R$ 4 mil”. No tempo de concessão da usina, as perdas acumuladas pelos atingidos seriam da ordem de R$ 1 bilhão.
Povos milenares
Os pesquisadores Bruna Rocha e Raoni Vale, da UFOPA, contestaram o mito de que a região a ser impactada é um vazio demográfico. Segundos eles, no parque nacional da Amazônia, por exemplo, há dezenas de sítios arqueológicos que comprovam a ocupação milenar da região. Esses registros estão ameaçados pela construção das usinas. Eles defendem que não se trata apenas de patrimônio arqueológico, mas também patrimônio cultural imaterial das comunidades indígenas.
A “lição” de Belo Monte
A procuradora do MPF Thaís Santi fez um relato da tragédia causada pela construção de Belo Monte, exemplo recente também na região oeste do Pará. “Belo Monte é uma irresponsabilidade do Estado Brasileiro com a Amazônia. Não existe prova de competência do Estado Brasileiro para construir outra barragem na região enquanto não resolver os passivos de Belo Monte.”
Uma obra desnecessária
“O Brasil não precisa de hidrelétricas no rio Tapajós”, afirmou Célio Bermann, professor do Instituto de Energia e Ambiental da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ele, o Plano Decenal de Energia que coloca como prioritária a construção de São Luiz considera um crescimento do PIB para os próximos anos de 6%. Além disso, a maior parte da demanda da energia é para a indústria eletrointensiva.
O pesquisador ainda afirmou que são necessárias mudanças na legislação para revogar a lei da suspensão de segurança e para garantir o direito dos atingidos de dizer não aos projetos de barragens.
– Esta matéria foi originalmente publicada no MAB Amazônia e é republicada através de um acordo para compartilhar conteúdo.