Em artigo publicado na Science, pesquisadores de oito países criticam processo de decisão sobre construções de hidrelétricas nas regiões tropicais.

Manaus, AM — Barragens são uma ameaça à biodiversidade também em outras regiões tropicais, não apenas na Amazônia. Existem aproximadamente 450 projetos de hidrelétricas nas bacias dos rios Amazonas, Congo e Mekong planejados sem a devida avaliação dos impactos ecológicos, sociais e até mesmo econômicos que podem causar.

A conclusão está em um artigo publicado na sexta-feira (08), na revista Science, por um grupo de quarenta pesquisadores de academias, governos e organizações conservacionistas de oito países. Embora os autores reconheçam as necessidades de geração de energia, os benefícios econômicos desses empreendimentos vem sendo exagerados, ao mesmo tempo que os efeitos a longo prazo na biodiversidade, em regiões ricas ecologicamente, estão subestimados.

“Estas três bacias hidrográficas abrigam cerca de um terço das espécies de peixes de água doce do mundo”, afirma o autor principal do artigo, Kirk Winemiller, professor de Ciências da Vida Selvagem e Pesca na Universidade do Texas. “As 450 barragens adicionais que estão sendo planejadas ou em construção nessas bacias colocam muitos peixes originais em risco”.

Eles alertam que muitos países tropicais não têm protocolos para orientar as construções de hidrelétricas e isentam pequenas barragens de qualquer processo formal de licenciamento. O professor assistente de Conservação de Peixes da Virgínia Teca, Leandro Castelo, lembra ainda que muito dinheiro é gasto em avaliações de impacto ambiental sem nenhuma influência real sobre o projeto, muitas vezes concluídos após o início das obras. “A falta de transparência durante a aprovação da barragem levanta dúvidas sobre se os financiadores e público estão conscientes dos riscos e impactos sobre milhões de pessoas”, afirma.

As corredeiras de Volta Grande, trecho do Baixo Xingu, o maior tributário do Amazonas é lar de dezenas de espécies endêmicas de peixes. Foto: Kirk Winemiller/Texas A&M.

A usina de Belo Monte recebe destaque negativo dos pesquisadores. De acordo com eles, a hidrelétrica pode estabelecer um recorde para a perda de biodiversidade, pois está sendo construída em um local com um número “excepcional”, nas palavras deles, de espécies endêmicas. A construção de centenas de barragens na Amazônica, conforme previsto, vai causar impactos como a realocação de populações humanas e avanço do desmatamento, alertam os autores do artigo.

Na Tailândia, onde estão planejadas 88 barragens, elas podem causar uma expansão de 19% a 63% das terras agrícolas para compensar o impacto das barragens na pesca local. Comunidades do Alto Rio Mekong, conforme o artigo, podem sofrer desafios semelhantes, caso sejam construídas seis barragens previstas.

Os pesquisadores destacam que já existem informações suficientes para análises sofisticadas que possam equilibrar os custos e benefícios da energia hidrelétrica. Eles cobram das instituições que financiam ou licenciam esses empreendimentos que exijam estudos que avaliem os impactos cumulativos ao longo das bacias e as alterações climáticas provocadas pelas barragens. Ainda segundo os autores, ajustes nos procedimentos de avaliação das obras poderiam assegurar que os benefícios sociais da produção de energia sejam obtidos, sem prejudicar o Meio Ambiente.

Vídeo: Barragem de Belo Monte recebe água desviada do canal principal do Rio Xingu. Após gerar energia, a água desviada retorna ao Xingu. Crédito: Leandro Souza

 

– Esta matéria foi originalmente publicada no OEco e é republicada através de um acordo para compartilhar conteúdo.

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