Com satélites, cientistas desvendam impactos do desmatamento na Bacia Amazônica e o que alterou a foz de um rio impedindo seu encontro com o oceano
COMO MORRE
UMA POROROCA
BACIA AMAZÔNICA
Um dos fenômenos naturais mais impressionantes, o encontro das águas doces com o oceano Atlântico formando ondas enormes e violentas, não ocorre mais no rio Araguari, no Amapá.
A pororoca no Araguari era uma das mais aguardadas por surfistas e turistas do mundo todo.
A extinção do fenômeno no Araguari é considerada irreversível por pesquisadores e ocorreu devido ao desmatamento nas suas margens. Seu fim oficial foi declarado em 2015.
Enchentes na última década desviaram ao rio Amazonas a maior parte das águas do rio Araguari, que chegava até o Atlântico.
Três hidrelétricas, canais para irrigar fazendas e margens destruídas pela criação de búfalos, debilitaram ainda mais o manancial e feriram mortalmente a pororoca.
1999
oceano
Atlântico
rio Araguari
rio Amazonas
2017
oceano
Atlântico
rio Araguari
canal Urucurituba
rio Amazonas
“A vazão média do Araguari foi 98% capturada pelo canal Urucurituba. Efetivamente o rio desapareceu. Ações humanas como a degradação da vegetação e o pisoteamento dos animais criaram as condições para que se formasse o canal, que desviou a água quase toda para o Amazonas.”
Gabriel Abrahão, pesquisador no Potsdam Institute for Climate Impact Research (Alemanha)
A mudança da distribuição das águas na Bacia Amazônica foi analisada por dezenas de cientistas que monitoraram por satélites a hidrologia do local nos últimos 30 anos.
Publicado na Reviews of Geophysics, a pesquisa aponta que ações humanas e alterações climáticas provocarão mais chuvas e inundações no norte amazônico e secas mais severas ao sul da região.
A Bacia Amazônica é a maior bacia fluvial do planeta. Tem cerca de duas vezes a área da Índia, mais de 6 milhões de km². Dela flui 20% da água doce para os oceanos.
Seus ambientes naturais influenciam o clima global, reforçam chuvas na América do Sul e fazem um balanço entre a captura de carbono e as emissões de metano, gases que contribuem com o efeito estufa.
As mudanças observadas pelos pesquisadores na distribuição e contorno dos rios ou até mesmo sua extinção, como ocorreu com o Araguari, afetam a vida de animais, plantas e pessoas e aumentam o risco de morte das florestas.

“Isso mudará o fluxo do próprio rio Amazonas. Certas mudanças são naturais, mas a ciência mostra o que é natural e o que é provocado pelo homem.”
Rodrigo Paiva, doutor em Hidrologia pela Universidade Toulouse (França) e um dos autores do estudo
O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) alerta que, até o fim do século, o aquecimento global reduzirá em um terço o fluxo de água na bacia do Tapajós e pela metade na bacia do Araguaia-Tocantins, ambos afluentes do Amazonas.
REPORTAGEM
Aldem Bourscheit

EDIÇÃO
Sílvia Lisboa

IMAGENS SATÉLITE
Estudo “Amazon Hydrology From Space: Scientific Advances and Future Challenges”, Internacional Rivers

IMAGENS
Lilo Clareto (Amazônia Real), Christian Braga e Fabio Nascimento (Greenpeace), Bruno Gonzalez, Raphael Alves (Amazônia Real), Vídeo (Prefeitura Municipal de Macapá (Macapatur)

MONTAGEM
Laiza Lopes

IDENTIDADE VISUAL
Clara Borges