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5 anos de InfoAmazonia: o que aprendemos e para onde queremos ir

Depois de meia década, seguimos na estrada com o desafio não comunicar a Amazônia como lugar exótico

Por Gustavo Faleiros

Há cinco anos, durante a histórica cúpula de desenvolvimento e meio ambiente da ONU, a Rio+20, nascia o InfoAmazonia. Naquele momento em que o mundo debatia metas de sustentabilidade, fizemos nosso “manifesto”: o direito à informação é parte da construção de um futuro mais equilibrado.

Ao longo destes anos, o InfoAmazonia pendeu entre um veículo de mídia independente e uma iniciativa não governamental com ações de capacitação e desenvolvimento de tecnologia. Investimos tanto em reportagens multimídia – sendo o nosso principal exemplo o especial “A Política do Desmatamento” – como em tecnologia de informação – neste caso, destaco a rede de sensores de qualidade de água implantada em Santarém, no Pará.

O InfoAmazonia foi precursor do geojornalismo – ou seja, o uso de imagens de satélite, dados e reportagens mescladas à cartografia para narrar fenômenos socioambientais. Assim como na geografia, o personagem de nossas histórias não é apenas o Homem, mas sua relação com o território e as mutações constantes originadas desta interação

Talvez em nenhum outro lugar do mundo, a História esteja sendo escrita com tamanha resolução – nitidez pode-se dizer – como na Amazônia. Observada por satélites orbitando a terra desde os anos 1970, a floresta tropical revela, através do desmatamento, mudanças em grande escala.

Hackatona promovida pelo InfoAmazonia para monitorar a qualidade da água (Foto: Bruno Fernandes)

Nestes cinco anos de nosso projeto, fizemos grandes esforços para narrar o curso desta transformação. Agregamos dados de diferentes instituições sobre alertas e indicadores de desmatamento, queimadas, polos madeireiros, produção de gado, soja e outras commodities.

Com a ajuda de um parceiro fundamental, a RAISG, evidenciamos o impacto de atividades extrativas, mineração e petróleo, dentro de unidades de conservação e terras indígenas, além da extensão dos planos para novas hidrelétricas na maior bacia hidrográfica do mundo.

Fizemos isso utilizando a linguagem dos mapas interativos e visualização de dados, pois acreditamos que assim a urgência dos fatos se torna bastante evidente. Optamos pelo uso de publicações digitais e produzimos o conteúdo em português, espanhol e inglês, como forma de atingir um público global.

Claro que esta pretensão encontrou limites. Afinal, a Amazônia são muitas amazônias, para usar uma frase que já soa clichê. Se considerada a extensão da bacia como um todo – aproximadamente 5,5 milhões de quilômetros quadrados, abarcando 9 países – pode-se imaginar a dificuldade de se criar narrativas que tenham interesse comum.

Hoje, cerca 60% dos usuários do InfoAmazonia estão localizados no Brasil, seguidos por pessoas nos EUA, Peru, Colômbia e Reino Unido. A pergunta mais incômoda por trás deste resultado é se a nossa opção pela Pan-Amazônia é realmente relevante. Ou ainda, se, como organização, temos a capacidade de cobrir um território do tamanho da Europa. O InfoAmazonia, afinal, nasceu incubado em uma ONG brasileira, (((o)))eco.

Entretanto, nossa proposta desde o início sempre foi fazer esta cobertura jornalística com um ângulo que fosse além do tradicional sentimento de possessão que os brasileiros têm em relação à Amazônia. Temos parceiros no Peru, como o sites de noticias Actualidad Ambiental e Ojo Público, e na Colômbia, com informações do importante jornal El Espectador.

Mas tratar os temas amazônicos sempre em grande escala, ou enfoque transnacional, talvez não seja o mais efetivo para comunicar com o público. Neste aspecto, vejo que algumas histórias recentes com foco local, nas quais a dimensão cultural e social estão presentes, têm maior apelo ao público. Os conteúdos que tratam dos povos indígenas ou das populações tradicionais da Amazônia estão entre os mais lidos e compartilhados. A história mais lida desde o lançamento do InfoAmazonia trata do iminente fechamento das comportas de Belo Monte e o impacto sobre a vida de comunidades indígenas e ribeirinhas no Xingu.

Por outro lado, os desejos da audiência não são tudo. A Ciência nos mostra a cada dia que a floresta tropical e o clima estão conectados e com influência que vai muito além dos nove países que compartilham a bacia amazônica. A regulação do ciclo hidrológico, ou seja, a influência da Amazônia nas chuvas de toda América do Sul, é prova disso.

Alguns dos trabalhos feitos em parceria com cientistas, como é o caso do documentário “Andes Água Amazônia” e a reportagem “Costing Nature”, revelam a importância de um olhar macro (ou sistêmico) sobre o bioma. Uma aliança em particular que nos deu bastante orgulho foi feita com pesquisadores indígenas através do Instituto Socioambiental para gerar o calendário “Ciclos Anuais do Rio Tiquié”.

A partir de agora, o nosso desafio será buscar essa conexão entre o local e global para criar uma narrativa que seja relevante. Para contar esta história da gigante Amazônia é preciso entender das dificuldades do pescador às peripécias de um pesquisador que coletou dados durante uma expedição. Hoje, me parece mais certo do que nunca que a informação qualificada pode dar a real importância deste bioma, tanto para as pessoas que vivem em suas matas e rios, como para quem apenas o conhece à distância.

A verdade é que, como fizeram os primeiros “exploradores”, nós, comunicadores, continuamos a tratar a Amazônia como um lugar exótico.

Ainda que alguns de nós, do InfoAmazonia, estejamos por anos trabalhando na região, visitando-a continuamente, ainda são muitas as surpresas sobre a cultura, as questões sociais e ambientais. Não dá para negar que o InfoAmazonia, ao adotar o mapa e a vista espacial da Amazônia, distanciada, de alguma maneira reforça o discurso de que “a maior floresta tropical do mundo” é um recurso. Uns, como nós, queremos protegê-la. Outros, que seguimos nomeando através de nossas matérias, parecem mais preocupados em exauri-la.

Aproveitando estes cinco anos de vida, o InfoAmazonia está fazendo este exercício de revisão para pensar o seu futuro e fugir das armadilhas neocolonialistas. Certamente, o geojornalismo e a linguagem dos mapas seguirá sendo o nosso diferencial. Isso nos permite, através dos dados, dar contexto às notícias. Mas, ao mesmo tempo, estamos buscando ampliar nossa comunidade, nossos parceiros, trabalhando em nível local. Enquanto as imagens de satélite nos mostrarão as grandes mudanças da Amazônia, as histórias pessoais vão revelar os caminhos para que estas mudanças sejam benéficas para a maioria.

*Gustavo Faleiros é editor do InfoAmazonia

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Gustavo Faleiros

Gustavo Faleiros é co-fundador do InfoAmazonia e editor da Rainforest Investigations Network (RIN) do Pulitzer Center

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